Diário da CPTM
365 dias de uma passageira
13/12/2016
Ah, que o Natal chega e a vida de usuário da CPTM ganha nova dinâmica.
365 dias de uma passageira
13/12/2016
Ah, que o Natal chega e a vida de usuário da CPTM ganha nova dinâmica.
A começar pelos horários.
Horário de pico na CPTM está diretamente relacionado com a vida produtiva e escolar da população.
Portanto, não tem mistério: horário de entrada no trabalho e na escola são os horários de pico na CPTM. Ponto final!
Sendo assim, se você chegar à estação às 7 horas da manhã, encontrará o trem cheio.
Se chegar às 17 horas, encontrará o trem cheio.
Se chegar às 14 horas, poderá viajar tranquilamente, sentado, sem pisão no pé.
Mas, quando chega o Período Natalino.... tudo muda!
Os horários de pico matutinos se aliviam gradativamente, com a chegada das férias escolares.
No dia a dia da composição, entre as inúmeras mochilas de trabalhadores madrugueiros, viajam também mochilas de livros e cadernos...
O perfil dos proprietários das mochilas escolares é bem típico: as mochilas vem acompanhadas pelos celulares com aplicativos de música, não raro, nos meninos, os bonés de aba reta, as tatuagens e os tênis com cadarços levemente frouxos, deixando os pisantes sambando nos pés. Nas meninas, cabelos multicoloridos, piercings no nariz, unhas esmaltadas com adesivos ou cores diferentes em um dos dedos. E o celular plugado aos ouvidos, sem sombra de dúvidas.
E a meninada estuda no trem! Quando sentados, com a mochila como escrivaninha, cadernos espirais universitários abertos, muitas vezes em páginas de simulados. É incrível a quantidade de alunos de cursos técnicos que frequentam os trens.
Técnicos em enfermagem, nutrição, elétrica e mecânica, são os campeões dentre os usuários a CPTM.
Nos horários de pico noturnos predominam os universitários que trabalham durante o dia. O que diferencia uma parcela de estudantes da outra é a vestimenta. Os universitários geralmente trajam roupas sociais, pois voltam à noite da escola depois da jornada de trabalho diurna.
Coisa incrível como a população do trem é fortemente vincada pelo viés estudantil.
Que bom. Mas.... por quanto tempo ainda será assim?
Ando de trem há mais de três décadas e posso afirmar: nunca houve tantos estudantes viajando de trem, de forma tão autônoma e determinada.
A mão de obra do país também vai na CPTM. O perfil difere dos estudantes em colorido.
A pele tem outra cor. O olhar tem outro brilho. O cabelos também... brilham diferente...
Entre os trabalhadores homens predominam as cores mais sóbrias, a calça jeans, a camiseta, o tênis escuro, botas ou sapatos robustos e mochilas. Todos tem uma mochila. Vida itinerante onde a casa real é apenas dormitório e a casa itinerante vai junto, presa ao corpo pelas alças de uma bolsa, onde cabe uma muda de roupa, uma garrafa d'água, a carteira, a marmita, o guarda-chuva... alguns levam a bíblia, um livro, um remédio qualquer. E o espaço no trem é calculado por pessoa, sem levar em conta que cada um que embarca leva consigo a própria casa às costas...
As mulheres, então, que coisa linda! Levam, além casa, o salão de belezas. Levam a muda de sapatos, levam o amor próprio e a autoestima. Arrumam-se cuidadosamente no trajeto. Muitas delas fazem isso em pé, em um espaço exíguo, demonstrando habilidade quase circense, agregando contorcionismo, ilusionismo, malabarismo, equilibrismo e, acima de tudo, desenvoltura e teatralidade. Levam a capa e espada para defesa pessoal contra os "abusadinhos". Levam a maternidade dentro do celular por onde orientam os filhos à distância. Nossa, levam tanta coisa!
O trem leva tanta coisa que é difícil descrever.
E, no Natal, leva sonhos....
Se esvazia de gentes e leva sacos, caixas e sacolas, como um trenó!
Leva sacos de pertences adquiridos nas ruas de comércio popular de toda São Paulo.
Na linha Turquesa predominam as compras feitas na Rua 25 de Março, Maria Marcolina e José Paulino. Brás e Luz presentes no movimento comercial do Natal.
A região central de São Paulo abastece todo o comércio de bugigangas natalinas de origem chinesa, baratinhas, sub-precificadas às custas da mão de obra escrava. Abastecem as lojas de shoppings com roupas confeccionadas por Bolivianos sub remunerados da região da Luz, Coreanos aprisionados do Bom Retiro, Nordestinos não recenseados de todo o país.
Aqueles sacos e sacolas gigantes, levados dentro da CPTM levam, a precinhos populares, as mesmas roupas que pendem dos cabides de magazines, diferindo das roupas do shopping apenas na etiqueta, existente nestas e ausentes naquelas....
E os sonhos embarcam na composição da CPTM embalados em sacos de lixo, em sacolas gigantes, amarradas em carrinhos de bagagem, em caixas de papelão fechadas com fita adesiva larga. São tantos pacotes que tumultuam o embarque no horário de pico Natalino, que, pasmem, altera-se sensivelmente.
No período Natalino o horário de pico acontece entre as 12 e 14 horas. O pico é em pleno horário de almoço.
Quando o sol esquenta, as sacoleiras, assim chamadas por conta de suas bagagens, já encerraram suas compras.
Rumam para a estação em grupos de 3 ou quatro. Alegres, falando alto, debochando das vendedoras ou reclamando dos donos das lojas, comemoram os bons negócios. Festejam as boas compras e, ainda mais, as possíveis vendas.
Vão tantos sonhos dentro daquelas sacolas....
Vai a boneca da filha, vai o carrinho do filho, vai o panettone da ceia, vai o celular novo do marido, vai a quitação da fatura do cartão de crédito, vai o bate-e-volta pra Santos no Réveillon.
Vai tanta coisa que o horário de pico deixa de ser meu foco nesta narrativa.
O foco agora é imaginário. Imagino o horário dos fogos, o horário dos brindes, o horário do amigo-secreto em família... Vejo os olhares, ouço a ansiedade. comemoro o presente recebido. Mesmo que não seja o meu!
Isso tudo se concretiza, dentro dos vagões da CPTM, durante as 3 primeiras semanas de dezembro.
Nas outras 49 semanas do ano o pico é outro. Não se assemelha em nada a essa agitação festiva de quem "camelou" o ano todo e foi se refestelar nas compras de Natal.
Nada, nadinha.
Ficam apenas duas certezas em quem observa tudo isso, como eu, há mais de 30 anos: o Natal deveria ser para todos, mas a CPTM, certamente, é somente para os fortes!
A mão de obra do país também vai na CPTM. O perfil difere dos estudantes em colorido.
A pele tem outra cor. O olhar tem outro brilho. O cabelos também... brilham diferente...
Entre os trabalhadores homens predominam as cores mais sóbrias, a calça jeans, a camiseta, o tênis escuro, botas ou sapatos robustos e mochilas. Todos tem uma mochila. Vida itinerante onde a casa real é apenas dormitório e a casa itinerante vai junto, presa ao corpo pelas alças de uma bolsa, onde cabe uma muda de roupa, uma garrafa d'água, a carteira, a marmita, o guarda-chuva... alguns levam a bíblia, um livro, um remédio qualquer. E o espaço no trem é calculado por pessoa, sem levar em conta que cada um que embarca leva consigo a própria casa às costas...
As mulheres, então, que coisa linda! Levam, além casa, o salão de belezas. Levam a muda de sapatos, levam o amor próprio e a autoestima. Arrumam-se cuidadosamente no trajeto. Muitas delas fazem isso em pé, em um espaço exíguo, demonstrando habilidade quase circense, agregando contorcionismo, ilusionismo, malabarismo, equilibrismo e, acima de tudo, desenvoltura e teatralidade. Levam a capa e espada para defesa pessoal contra os "abusadinhos". Levam a maternidade dentro do celular por onde orientam os filhos à distância. Nossa, levam tanta coisa!
O trem leva tanta coisa que é difícil descrever.
E, no Natal, leva sonhos....
Se esvazia de gentes e leva sacos, caixas e sacolas, como um trenó!
Leva sacos de pertences adquiridos nas ruas de comércio popular de toda São Paulo.
Na linha Turquesa predominam as compras feitas na Rua 25 de Março, Maria Marcolina e José Paulino. Brás e Luz presentes no movimento comercial do Natal.
A região central de São Paulo abastece todo o comércio de bugigangas natalinas de origem chinesa, baratinhas, sub-precificadas às custas da mão de obra escrava. Abastecem as lojas de shoppings com roupas confeccionadas por Bolivianos sub remunerados da região da Luz, Coreanos aprisionados do Bom Retiro, Nordestinos não recenseados de todo o país.
Aqueles sacos e sacolas gigantes, levados dentro da CPTM levam, a precinhos populares, as mesmas roupas que pendem dos cabides de magazines, diferindo das roupas do shopping apenas na etiqueta, existente nestas e ausentes naquelas....
E os sonhos embarcam na composição da CPTM embalados em sacos de lixo, em sacolas gigantes, amarradas em carrinhos de bagagem, em caixas de papelão fechadas com fita adesiva larga. São tantos pacotes que tumultuam o embarque no horário de pico Natalino, que, pasmem, altera-se sensivelmente.
No período Natalino o horário de pico acontece entre as 12 e 14 horas. O pico é em pleno horário de almoço.
Quando o sol esquenta, as sacoleiras, assim chamadas por conta de suas bagagens, já encerraram suas compras.
Rumam para a estação em grupos de 3 ou quatro. Alegres, falando alto, debochando das vendedoras ou reclamando dos donos das lojas, comemoram os bons negócios. Festejam as boas compras e, ainda mais, as possíveis vendas.
Vão tantos sonhos dentro daquelas sacolas....
Vai a boneca da filha, vai o carrinho do filho, vai o panettone da ceia, vai o celular novo do marido, vai a quitação da fatura do cartão de crédito, vai o bate-e-volta pra Santos no Réveillon.
Vai tanta coisa que o horário de pico deixa de ser meu foco nesta narrativa.
O foco agora é imaginário. Imagino o horário dos fogos, o horário dos brindes, o horário do amigo-secreto em família... Vejo os olhares, ouço a ansiedade. comemoro o presente recebido. Mesmo que não seja o meu!
Isso tudo se concretiza, dentro dos vagões da CPTM, durante as 3 primeiras semanas de dezembro.
Nas outras 49 semanas do ano o pico é outro. Não se assemelha em nada a essa agitação festiva de quem "camelou" o ano todo e foi se refestelar nas compras de Natal.
Nada, nadinha.
Ficam apenas duas certezas em quem observa tudo isso, como eu, há mais de 30 anos: o Natal deveria ser para todos, mas a CPTM, certamente, é somente para os fortes!
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