Diário da CPTM
365 dias de uma Passageira
19.03.2017 - crônica 2
Hoje é 19 de Março. Dia de São José, o santo padroeiro da cidade onde nasci, resido, vivo!
Hoje, na minha cidade, em homenagem ao Padroeiro e em comemoração ao aniversário da emancipação local, é feriado. E, além de tudo, é domingo.
Porém, contrariando todas essas informações, que seriam suficientes
para que a vida me concedesse o dia de hoje para ser desfrutado como
folga, saí cedo para trabalhar.
Habitualmente, aos domingos, vou de carro, já que o trânsito, mínimo, favorece a rapidez da viagem.
Hoje foi uma exceção: um aniversário na família fez com que meu carro,
compartilhado com meu marido, ficasse em casa, a serviço dos afazeres da
festa - Guilherme, nascido no dia do Santo Padroeiro de Ribeirão,
completou hoje 13 anos.
Então, lá fui eu para a estação.
Cidade silenciosa e recolhida.
Seria um dia cheio: previsão de um desfile cívico comemorando a
emancipação do município. Festa em família... Uma missa no fim do dia em
honra do padroeiro. E eu, mais uma vez, correndo para embarcar numa
composição da CPTM, rumo ao Theatro Municipal de São Paulo.
Como de hábito, redigi minha crônica, "quase-diária", dentro do trem. Falei da fé, da tentação e do propósito.
E acho que o dia de hoje estava propício para os assuntos da santidade!
Utilizo o tempo do percurso Ribeirão Pires-Brás para registrar minhas
impressões de tudo o quanto acontece nos trens da CPTM. Falo sobre
qualquer assunto que me toque. Desde as situações às pessoas, dos dramas
às comédias, do concreto ao abstrato.
Não há uma regra para meus temas.
Hoje foi assim... já havia falado das funcionárias da FAÍSCA, que
merecem minha total admiração. E hoje descobri que existe uma outra
empresa de limpeza que atua na CPTM: TONANNI.
Mas a empresa não me importa. A mim, importam as pessoas...
Hoje, ao chegar no Brás, absorta pela finalização da minha crônica
diária, falando da tentação e do propósito, terminando ainda o último
parágrafo, ouvi o aviso de chegada à estação e o sinal de abertura das
portas. Ainda sentada, redigindo o final da crônica, sem maiores
conferências, dei o "publicar", levantei e desembarquei...
Encarei as escadas, caminhei pelo saguão da interligação CPTM-Metrô e,
ao chegar no bloqueio, repetindo meu habitual gesto condicionado de
ajeitar a bolsa no ombro para cruzar as catracas, me dei conta de que
meu ombro estava leve e vazio...
Eu havia esquecido minha sacolinha, com as roupa do concerto, os sapatos, as partituras, ... tudo, ... tudo dentro do trem!
Saí de casa cedo, para cantar no Theatro e, naquele instante, me vi
privada dos paramentos todos que necessitaria para subir ao Palco.
Dei meia volta e corri loucamente em direção à plataforma da CPTM, sem muita esperança de sucesso.
Chegando, procurei pela segurança da plataforma, já que o trem trafegava para fora da plataforma, sendo recolhido.
Ela me indicou os profissionais de limpeza, que verificam os vagões
antes de liberar a composição para o início de outra viagem.
Ali,
na extremidade da plataforma, ao lado de um armário de alvenaria com
portas de vidro, encontrava-se um senhor uniformizado, em trajes que
indicavam, ser ele, funcionário da Tonanni.
Ao ver que me
aproximava desesperada, ele tranquilamente abriu as portas de vidro do
armário de alvenaria. Como por um milagre, vi surgir, de lá de dentro,
minha sacolinha, contendo meus paramentos todos, intactos, antes mesmo
que eu tivesse dito a ele o que procurava.
Ele já sabia!
Aproximou-se serenamente, estendeu o braço e na extremidade de sua mão pendia minha sacolinha contendo meus pertences.
Contrapondo-se à minha ansiedade, perguntou-me calmamente:
- É sua?
- Sim senhor! O senhor salvou meu dia! Muito obrigada!
- De nada, moça. Boa sorte.
- Por favor, qual é seu nome?
- José.
- Sim senhor! O senhor salvou meu dia! Muito obrigada!
- De nada, moça. Boa sorte.
- Por favor, qual é seu nome?
- José.
Naquele momento entendi que ao embarcar no trem para trabalhar, logo
cedo, em pleno feriado municipal, enquanto tantos outros desfrutariam
daquele dia de folga, fui contemplada com a companhia do Santo Padroeiro
da cidade onde nasci.
Ele foi, hoje, meu anjo da Guarda que, curiosamente, decidiu se paramentar de profissional de limpeza da CPTM.
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