quinta-feira, 29 de novembro de 2012

ANIVERSÁRIO




*** Do latim: anniversarius 
— AQUILO QUE RETORNA TODOS OS ANOS.

Hoje meu marido faz aniversário
44 anos.
18071 dias, considerando que do seu nascimento até hoje foram 11 anos bissextos.
385.704 horas, 23.142.220 minutos.

Tempo de pura integridade e criação.
De dedicação àquilo em que acredita e perseverança em busca do que necessita.

Meu marido é manhoso, tem coragem, cozinha bem.
Faz música, batuca na cozinha, na bancada do banheiro, no fundo das panelas, nas minhas coxas, costas e em tudo o que produzir som. É capaz de fazer uma bateria de escola de samba apenas com a fricção dos dentes. Demais, esse meu marido!!!

Meu marido tem risada rasgada, gargalha com uma soltura que é de dar inveja.
Não chora à toa, não perde tempo com divagações improdutivas, investe na sua fé e na sua disposição.
Afffffff, que disposição.
Ele não para nunca... e às vezes, dormindo, canta um samba, ralha com o filho, dá uma risada que depois acaba por ficar sem explicação: risada de sonho a gente não revela....
Meu marido faz aniversário e eu é que comemoro.
Comemoro pelo companheiro.
Comemoro pelo amigo.
Comemoro pelo pai que vejo agir com vigor e com carinho, sempre que a cria está por perto e que vejo silenciar a saudade e o temor pelo bem estar da cria, quando está longe.
O meu marido é tudo, ao mesmo tempo, o tempo todo.
É peladeiro, é bom amigo, é solidário, é sarrista e provocador.
Conta piada e ri sozinho, antes da piada acabar.
Lê tudo o que lhe cai nas mãos e tem uma visão de mundo que vi em poucos....
Gosta de alegria, mas busca o sossego.
Chega em casa e pronuncia: "Ai, que casinha gostosa!".

Aqui nessa casinha espero pelo meu marido.
Aqui nessa casinha, encosto nele pra dormir e penso: que bom, ele voltou...

É meu colega de traquinagens, é meu tutor nas infantilidades, é meu mentor nos gestos de coragem.
É minha ânima, meu esteio, meu farol.
Minha guia cruzada de proteção.
é meu amante, dono absoluto do meu coração.

Por isso esse termo aniversário, pra mim, serve pra marcar o dia em que eu digo pro mundo, abertamente, o que sinto por ele, anuncio e reafirmo: Meu marido é o meu amor. Faz anos hoje. Lindo, Corajoso, forte e companheiro como ninguém, jamais, conseguirá ser igual...

Dodô, amo você!

Feliz aniversário.



terça-feira, 27 de novembro de 2012

Intimidação por paradigma























Às vésperas dos meus 47 anos, faço uma reflexão sobre meus 30 anos cantando em coro, sobre a minha vida profissional e a minha escolha trabalhista.
Minha profissão somente coincidiu com minha escolha trabalhista aos 30 anos, quando abandonei um emprego bem estruturado em um banco estatal e migrei para o trabalho sem nenhuma garantia trabalhista, cantando.
Hoje apresento minhas reflexões sobre a convivência dentro de uma estrutura coletiva.
Profissão e emprego caminhando juntos, porém não de mãos dadas.
Sim, porque não escolhi ser cantora. Fui me tornando cantora atendendo a um chamado não consciente, que contrariava minha têmpera e me jogava em um mundo não talhado para mim.
O mundo do glamour das artes difere em muito do ambiente onde me sinto bem. De pés descalços, roupas e cabelos em desalinho. É assim que me sinto bem.
Mas minha profissão me aloca em um meio onde a imagem pesa mais do que a conduta.
Sou cantora de Coro. Como cantora de coro aprendi que a grande característica do trabalho em grupo e o que diferencia a prática coral da prática solística, é a aceitação e a absorção das diferenças.
Um coro é um indivíduo coletivo vivo. Possui sua personalidade sonora definida pela somatória dos sons individuais de seus integrantes.
Portanto, impor a um grupo um padrão sonoro ao qual o grupo deve se adaptar implica em impor uma ditadura da intimidação já na sua origem.
Qualquer maestro que se poste diante de um coro, impondo a ele este ou aquele cantor como exemplos sonoros a serem seguidos, como timbre a ser imitado, para que o resultado final do trabalho seja satisfatório, desconhece a natureza original da função que exerce e impõe aos integrantes do grupo que conduz uma ditadura da submissão e da destruição das individualidades, que necessitariam acolhimento na prática coletiva.
Quem se propõe a reger um coro deve ter em sua mente que estar diante do canto coletivo é como estar diante de uma força da natureza. Dona de seu próprio ritmo e determinante, na sua origem, da sua real forma de subsistência.
Um coro jamais soará como o maestro imagina. E os grandes maestros sabem disso.
O som do coro será a somatória das sonoridades individuais de seus integrantes, perfeitamente harmonizados dentro da prática coletiva.
Portanto, qualquer maestro que queira impor uma sonoridade a um grupo coral, seja ele qual for, estará fadado ao insucesso.
Então como é possível que alguns maestros sejam verdadeiros magos na arte de esculpir e personalizar a sonoridade de seus grupos, a despeito das características individuais de seus integrantes, e outros sejam os eternos discursantes em favor do som, que ainda está por ser conquistado?
Simples: os grandes maestros buscam a riqueza timbrística do grupo que regem explorando ao máximo as capacidades vocais de seus integrantes, definindo as diferentes nuances de sonoridade características do grupo que dirigem de acordo com o perfil sonoro do grupo, resultante da fusão de todas as individualidades. 
Um bom coro não é aquele que canta desde pianíssimos inaudíveis até fortíssimos estrondosos. É aquele coro que é capaz de traduzir em som a suavidade ou o vigor propostos pelo compositor, através das indicações de dinâmica, dentro de suas características timbrísticas próprias, sem buscar imitar este ou aquele registro sonoro existente no mercado, tidos como referenciais. (Lembrando que, as indicações de dinâmica, às quais os músicos medíocres se curvam, indicam, na realidade, variações de intenção, de ânima, não de volume).
Os registros referenciais da música coral, como de qualquer outra arte, são justamente aqueles que não se prestam a imitar ninguém.
Os imitadores jamais serão referência para nada!
E os grandes maestros são os que rejeitam a imitação. São aqueles que produzem sons inéditos e eternamente inimitáveis, diferentes de grupo a grupo.
É isso que identifica os grandes maestros de coro: a capacidade de construir a homogeneidade através da aceitação da diversidade. O organismo vivo "coral" somente existe porque não é possível definir o timbre de um ou outro cantor como o timbre a ser copiado e reproduzido pelos demais cantores. O Coro somente funciona como tal quando todos os cantores contribuem com sua parcela em igual proporção sonora, sem que os integrantes do grupo sejam obrigados a permanecer de joelhos diante das imposições de gosto de seu maestro, que elege este ou aquele cantor como exemplo a ser copiado e como objetivo performático a ser atingido.
Os grandes maestros de coro são aqueles que aceitam e acolhem as diferenças sonoras dos integrantes de seus grupos, sem hierarquizá-los de forma perversa.
O oposto desta conduta é o que gera os maestros medíocres e tiranos, que não sendo capazes de construir uma identidade musical para seus grupos, transformam-nos em simples copiadores de sonoridade, destinados à eterna frustração, posto que, uma imitação, por mais perfeita que seja, é sempre uma imitação.
Incrível como a mediocridade e a tirania andam de mãos dadas.
Por serem incapazes de personalizar seu trabalho de maneira eficiente, posto que buscam sempre imitar exemplos que consideram ideais, em vez de colocar sua escuta a serviço da aceitação da sonoridade do grupo que tem em mãos e torná-la típica e eficaz, eternos insatisfeitos, vão se desfazendo, de maneira leviana, da matéria prima de seu trabalho: seus cantores. Como quem se desfaz de uma roupa que não cabe mais ou como quem corta o cabelo de maneira radical para mudar totalmente o próprio reflexo, indesejado, visto no espelho.
Assim, maestros medíocres impõe a ditadura do exemplo individual estanque para um organismo coletivo vivo.
Desta forma, na prática coral, como na vida, fica estabelecido o padrão a ser perpetuamente seguido como exemplo, desconsiderando que uma vida íntegra, seja de um organismo individual ou coletivo, tem suas próprias especificações e obedece a uma lei própria, que não se curva, voluntaria e impunemente, à imposição da ditadura do padrão estético.
As pessoas se curvarão, por motivos diversos. Mas o organismo coletivo, vivo, resultante da aglutinação destas pessoas, estará sempre vociferando, a despeito da vontade consciente de seus integrantes. 

A perpétua recusa à submissão gritará silenciosamente contra a intimidação de origem — aquela que renega a natureza coletiva simplesmente para satisfazer um gosto ou desejo individual — negando ao maestro tirano a sonoridade por ele idealizada, fruto dos concertos que rege em seus sonhos, ainda por serem realizados, ou simples projeções de seus delírios cotidianos. 
Esta é a função do canto coral: demonstrar, através de uma prática coletiva intimista o que acontece de forma macroscópica na vida; sempre que um padrão individual é imposto como paradigma para estruturas coletivas, pode haver a submissão temporária e frágil dos integrantes do coletivo, mas jamais haverá a serenidade que garante a longevidade e o sucesso, estáveis porém ativos e produtivos.
Esta força está viva, e não se submete os padrões estéticos dos maestros medíocres, insubordinados aos ditames da prática coletiva do organismo CORO. Ela é a força que incomoda os maestros eternamente insatisfeitos, de guilhotina a postos, prontos para degolar os questionadores e porta-vozes da insatisfação coletiva, que se mantém disfarçada e escondida, sob sorrisos amarelos da convivência cotidiana, mas que se expressa entredentes, nos bastidores, no recolhimento dos lares, na intimidade dos confessionários, sempre que a oportunidade aparece, sempre que a voz embarga, sempre que a individualidade é desrespeitada e desconsiderada. E não se iludam, a força vital que caracteriza o organismo CORO permanece viva, mesmo que as diferenças sejam radicalmente extirpadas. Logo surgirão outras diferenças a serem eliminadas.
Pena que a força do coletivo não esteja amparada pela coragem dos indivíduos, muitas vezes desestruturados pela própria intimidação inerente ao discurso propalado pelos medíocres, criadores de uma imagem de beleza, imposta como correta e propagada como objetivo a ser atingido.
A escolha profissional, individual, está totalmente subordinada à vida trabalhista, coletiva e um cantor de coro sabe disso! Abdica voluntaria e, por vezes, inconscientemente, da projeção pessoal para construir uma história coletiva.
Isso explica a eterna inquietude: enquanto estruturas coletivas forem conduzidas por líderes medíocres, autorreferentes, pasteurizadores de comportamentos, condutas e sonoridades, não haverá possibilidade de realização individual. Permanecerão todos insatisfeitos, sem nem mesmo saber por quê! 
Porque uma liderança tirana por definição é aquela que não respeita as diferenças, não as inclui, não as suporta. É aquela em que o líder não passa de um agente que estabelece a intimidação tácita como paradigma. É aquela que luta contra as diferenças, procurando eliminá-las de forma definitiva, o mais depressa possível.
Como na vida em sociedade, o Canto Coral precisa se livrar da opressão imposta pela predefinição e conquistar a sonoridade/imagem resultante da aceitação das diferenças entre seus integrantes. Isso sim garantirá a realização profissional a todos, e nos livrará, cantores pelo mundo a fora, de uma subordinação trabalhista, frustrante e opressiva.

Não precisa ser assim! É possível ser feliz cantando coletivamente...
Aliás, em tempo:
— Onde estão os grandes maestros de coro?
— Apresentem-se por favor!

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Veredicto (*)






Em silêncio, no confessionário do teu peito,
cala a mágoa que não se apagará!
Suporta a sensação.
Olha pra ti mesma diante do espelho e não te surpreendas se reencontrares tuas lembranças passadas de recolhimento voluntário, tuas memórias vazias e tua história de inexistente interlocução.
Carrega o peso da tua imagem, mesmo que ela não traduza a realidade do teu ser.
Perdoa o julgamento enviesado.
Perdoa o reconhecimento que não foi endereçado a ti.
Perdoa-te por não produzirdes uma obra de fácil interpretação e perdoa-te, sobretudo, por nunca seres julgada com o mesmo crivo que os demais.
Tu não és como os demais.
Tu não aceitastes as regras do jogo. E não o fazes simplesmente para, depois, não seres julgada culpada.
És culpada mesmo assim!
Podes receber tal julgamento, mas o recebas com a certeza de que nem todo julgamento, independentemente da etimologia, é justo.
Ainda continuarás olhando à tua volta e caminhando no lodo.
Ainda continuarás respirando o ar fétido e infecto gerado pelo esquecimento vil dos  fatos ocultos.

                   ***
— Ainda?
— Ainda...
— Hmm, ainda!
                   ***
Sabes o que farás?
Guardarás a tua desesperança pra ti.
Calarás a tua insatisfação com um sorriso.
Suportarás  tua derrota com a dignidade de uma vencedora.

                    ***
— Ainda não é o momento.
— Não?
— Não!
— Hmm, não...
                    ***
E quando será?
Talvez amanhã, talvez nunca.
Neste teu teatro, minúsculo no teu despeito, de certo, apenas a convicção de que é preciso deixar as coisas se acomodarem.

                     ***

— Novamente?
— Novamente!
— É, novamente...

Talvez pra sempre.

— Cala.

(*) "Veramente dito"